JÁ À VENDA!
“Infelizmente, as coisas já não são o que eram” diz o dono do bar enquanto tira um café curto. A frase não é para mim; o café, sim. Está na conversa com algum cliente habitual, o tema já vem de trás. “As coisas já não são o que eram”. Eu penso na caminhada que acabei de realizar.
Durante dois milénios ─ desde que os romanos construíram a estrada de Olisipo a Aeminium até à invenção do comboio ─ os tempos e os modos de transitar entre Lisboa e Coimbra, e pelo resto do mundo também, permaneceram quase inalterados. Caminhar não era uma opção bizarra, era a forma mais comum de viajar. Personagens de maior riqueza poderiam seguir no dorso de um cavalo ou de um burro, mas a maioria dos viajantes não tinha essa possibilidade. Seguia a pé.
As pessoas não mudavam de cidade, não iam de férias, não aceitavam empregos distantes de casa, não iam visitar parentes ou amigos que morassem longe. A mobilidade era um ato irregular. Era necessário um motivo muito sério, longamente ponderado, impreterível e sem alternativa viável para um europeu se fazer à estrada. Missionários, embaixadores, soldados, princesas prometidas por razões de estado a príncipes longínquos, peregrinos.
A minha caminhada demorou oito dias, no final do Verão, e foi uma peregrinação no sentido mais lato do termo: não religiosa, mas certamente espiritual. Evitando o asfalto e procurando bosques e planícies, paisagens rurais e cidades antigas, a caminhada foi também um reencontro com as paisagens, a História e os ambientes culturais da minha pátria. E foi um longo, preguiçoso devaneio por memórias e momentos formativos da minha vida. Foi, portanto, uma experiência pessoal e bastante introspetiva, mas tão luminosa e inspiradora que quis que fosse partilhada contigo.